quinta-feira, 30 de maio de 2013

"A propaganda brasileira depois de Washington Olivetto", João Renha


Tô lendo. Bom para cacete. recomendo. Olivetto é o cara da Publicidade. Obrigado, professor Fernando Sá, da Facha e da PUC.

Para saber mais, clique AQUI.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

"Gracias a la vida", Cid Benjamin

Meu querido amigo Cid Benjamin acaba de escrever suas tão esperadas memórias. O livro já está na editora. Estou lendo os originais e adorando. O prefácio é de outro querido amigo, Milton Temer. O Dia já publicou matéria sobre o livro. Para ler, clique AQUI. O Estadão também. Reproduzo abaixo. Assim que sair, aviso.

Foto: Eduardo Sarmento (publicada em O Dia)

Autobiografia de um torturado

Em ‘Gracias a la Vida’, Cid Benjamin, veterano da guerrilha e ex-petista, diz que oficiais torturadores admiravam presos políticos

WILSON TOSTA

Exatos 43 anos atrás, no Dia de Tiradentes de 1970, perto das 19h30, Paulo Alves, 21 anos, óculos para miopia, 1,71m de altura, entrou com uma pastinha de plástico preto em uma padaria na esquina das Ruas Vilela Tavares e Dias da Cruz, no Méier, no subúrbio carioca. Recostado ao balcão, depois de pedir um guaraná e, ironicamente, um sonho, preparou-se para esperar alguém que logo deveria chegar ao ponto de ônibus a alguns metros dali, para tratar de assunto urgente. Perto dele, um homem passado dos 30 o observava. Em frente, alguns rapazes - barbudos, cabeludos, de bermudas - conversavam, animados, em uma sorveteria, parecendo aproveitar o fim do dia sem trabalho para relaxar. Subitamente, porém, todas essas fantasias se desfizeram: o grupo atravessou a via às pressas, Alves tentou pegar algo na pasta, o homem que o olhava lhe deu uma gravata por trás gritando: "Tá em cana!". E as coisas começaram a acontecer muito rapidamente para todos.
Mais de 30 anos depois, Cid Benjamin volta à solitária do Dops para fotografias - Fábio Motta/Estadão
Fábio Motta/Estadão
Mais de 30 anos depois, Cid Benjamin volta à solitária do Dops para fotografias
Primeiro, o preso, impossibilitado de tirar da pastinha a pistola Colt 45 que carregava, com um golpe de judô - era campeão brasileiro juvenil do esporte - jogou sobre o ombro o homem que o agarrara, o major Moacir Fontenelle, que desabou sobre o balcão. Os tais jovens - todos agentes à paisana do DOI-Codi do I Exército - atacaram o preso com coronhadas de fuzil, socos e pontapés. E Alves - nascido Cid de Queiroz Benjamin, um dos guerrilheiros mais procurados do País, chefe da Frente de Trabalho Armado (FTA) do Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR-8) - lutou, segundo seus captores (cujas ordens eram pegá-lo vivo), por 20 minutos. No fim, coberto de sangue, foi jogado em um carro, algemado e levado em meio a gritos de vitória dos repressores. Para trás ficou a padaria destruída e um agente com dentes quebrados, socorrido no Hospital Central do Exército (HCE).
A cena abre Gracias a la Vida, autobiografia em que Cid, hoje jornalista, professor e escritor, acaba de dar o ponto final. Nela, o ex-guerrilheiro, um dos fundadores do PT e atualmente crítico duro do partido e seus governos, se dedica a "mexer em casas de marimbondos" enquanto recorda sua vida e reflete sobre a política, atacando crenças da esquerda - algumas opostas a outras. "Vou levar porrada de todo lado", diz, entre divertido e conformado, ao lembrar sua trajetória sob a ditadura militar (1964-1985), quando participou do sequestro do embaixador dos EUA, Charles Elbrick. "Vou levar porrada do Tortura Nunca Mais; vou levar porrada dos marighellistas; vou levar porrada das viúvas da luta armada; vou levar porrada dos prestistas; vou levar porrada do PT; e vou levar porrada do PSOL."
Em tempo de Comissão da Verdade, uma das "casas de marimbondo" em que Cid mexe é a sua constatação de que a tortura, que sofreu durante seu primeiro período no DOI, no quartel da Rua Barão de Mesquita, na Tijuca, não foi praticada apenas por psicopatas sádicos e jovens militares extremistas da Guerra Fria, mas também por cidadãos "normais". Eram bons maridos, pais amorosos, vizinhos simpáticos, mas que tinham no suplício e até assassinato de seus semelhantes sua "rotina" profissional - impossível não lembrar a descrição de burocrata banal feita por Hannah Arendt (1906-1975) para o criminoso nazista Adolph Eichmann (1906-1962). Verdugos que, em alguns casos, se permitiam até sinais de admiração por suas vítimas, pela coragem que demonstravam diante da dor, embora não deixassem, claro, de fazê-las sofrer mais.
"Não quero que pareça que estou humanizando o torturador. O fato de um ou outro torturador não ser um monstro é mais grave: pessoas normais são capazes de torturar", diz Cid, tão torturado no DOI que reconhecia o suplício pelo tipo de gemido da vítima.
Polêmico? Pois fica ainda mais quando Cid se recorda no livro de um oficial do DOI, cujo nome preserva, que, em 17 de junho de 1970, no avião que levava para Argel os 40 presos políticos libertados em troca do embaixador Ehrenfried Von Holleben, da Alemanha Ocidental, sequestrado pela guerrilha urbana, sentou-se a seu lado. Em certo momento, disse mais ou menos o seguinte: "Você viu que não participei dos teus interrogatórios. Sou muito violento e gostei de você. Eu te respeito". Já na capital argelina, outro ex-preso, Apolônio de Carvalho, do PCBR, cuja bravura no enfrentamento dos verdugos era venerada na guerrilha, contou-lhe outro episódio envolvendo o mesmo oficial. Um dia, ele quis tirar Apolônio da cela para algo que era proibido para os presos: um banho de sol de uma hora.
"Você é mais velho, está machucado, e eu respeito a tua coragem", disse o torturador, antes que o dirigente do PCBR, diante da informação de que só ele teria o benefício, recusasse o privilégio. Para o autor, o gesto do militar era sinal claro de admiração pela coragem de Apolônio, típica da formação militar (o pai de Cid era do Exército). "Como se (o torturador) dissesse: ‘O cara é inimigo, se for o caso vou matá-lo, mas eu o respeito."
Cid avalia que, quando foi preso, o sistema de repressão ainda não se profissionalizara totalmente. Isso permitia que se desenvolvessem relações pessoais entre torturadores e alguns torturados, uma espécie de elite dos presos políticos. "Era o cara que vinha e dizia: ‘Olha, você é um cara legal, não vou perguntar nada que leve à prisão de alguém. Tudo bem?’", narra ele. Havia ainda recrutas que conversavam com os presos e identificaram torturadores pelos nomes.
O ex-guerrilheiro também surpreende ao falar do médico Amilcar Lobo, que participou das torturas e foi demonizado pelas esquerdas. "Considero que, nessa ocasião, nossa postura em relação a Lobo foi errada politicamente, além de ter sido desumana", diz, no livro. "Houve algo de vendeta em nosso comportamento. Lobo já era um farrapo e, ainda assim, foi acossado. Teria sido mais humano, e mais produtivo do ponto de vista de se desvendar o que aconteceu nos porões da ditadura, se lhe houvéssemos estendido a mão, compreendêssemos sua angústia e o amparássemos." Isso apesar de ter tido pontos na cabeça costurados sem anestesia pelo médico - no DOI, Dr. Carneiro -, que também lhe administrou pentotal na tentativa de fazê-lo abrir informações.
"Os torturadores devem ser punidos", insiste Cid. "Eu numa boa anistiaria quem me torturou. Só não anistiaria porque o futuro da tortura está ligado ao futuro do torturador. É uma questão política, não pessoal."
Não que o jornalista releve tudo. No livro, ele recorda que em 1989, no segundo turno das eleições presidenciais, bebia com amigos no Bar Amarelinho, na Cinelândia, no Centro do Rio, e precisou ir ao banheiro. Lá, no mictório, encontrou o policial Luiz Timóteo, torturador que se jactava de dar choques nos pênis dos presos. Dezenove anos antes, submetera o autor ao tratamento.
"Ficamos os dois, lado a lado, no mictório. Não havia mais ninguém. Olhei fixamente para seus olhos e perguntei: ‘Está lembrado de mim, Timóteo? Sou o Cid.’
‘Estou, sim’, ele respondeu, visivelmente receoso do que eu pudesse fazer.
‘Quem diria, hein. Você cansou de me dar choques no pau e, agora, o Lula vai ser eleito presidente da República.’
‘Vamos ver, vamos ver’, disse, cauteloso.
‘As coisas mudam, não é?’, retruquei, antes de voltar para a minha mesa."
Para as "viúvas da luta armada", Cid reservou uma avaliação de que o caminho da guerrilha foi um equívoco, pela impossibilidade de vitória. Mas não deixou de admitir que o sequestro de Elbrick foi um "gol de placa". E revela detalhes novos sobre o caso. Em meio à ação, conta, recebeu o apoio do pai, o oficial do Exército da reserva Nei Benjamin, janguista não ativo, que lhe enviou sua pistola de oficial, com a numeração raspada. Depois, quando foi preso (e, mais tarde, seu irmão César), Nei usou seus contatos militares para ajudá-los. Furtou na Bahia uma ficha que comprovava a prisão de César e, quando Cid estava no Dops, apoiou-o quando resistia a assinar depoimentos, dizendo-se orgulhoso de seu comportamento.
A recusa mandou Cid para a solitária, o "ratão", cela estreita, onde só podia dormir na diagonal e à qual voltou mais de 30 anos depois, para fotografias. Mesmo preso no Dops, ajudou a elaborar a lista de presos a serem libertados em troca de Holleben (recebeu o pedido de nomes em um maço de cigarros). Já esperava o sequestro - o MR-8 preparava a ação, que acabou executada pela Ação Libertadora Nacional (ALN) e pela Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). No exterior, passou nove anos e três meses por Argélia, Cuba (onde treinou guerrilha), Chile (de onde saiu depois do golpe), México e Suécia.
Assumidamente emocional, Cid revela no livro que chorou no dia do último comício de Lula em 1989 e de novo no dia da posse do presidente, em 2003, embora àquela altura já não acreditasse no velho PT. Poucos anos depois, porém, ao investigar o assassinato do prefeito petista de Santo André, Celso Daniel, e obter informações que levavam a um esquema de corrupção ligado ao partido e a outros homicídios, não reconheceu o partido que ajudara a construir.
"Contei a dois amigos de confiança - ambos do PT, diga-se - o que tinha apurado", relata, no livro. "Eles ficaram estupefatos. De um deles veio a sugestão: que eu gravasse as informações em CDs, os distribuísse para amigos, deixando claro que, se me acontecesse algo estranho - como morrer em um assalto na rua, por exemplo - as informações viriam à tona. Um terceiro amigo, também do PT, tinha audiência com um ministro todo-poderoso daí a alguns dias. Pedi que ele lhe desse o recado, o que foi feito (...) Não deixou de ser surpresa quando soube que a resposta tinha sido: ‘Tudo bem’. Confesso que esperava algum tipo de protesto. A advertência que fiz era também uma insinuação."
Cid ressalta que não acredita em participação da cúpula do PT nos homicídios. Faz, porém uma impiedosa crítica ao partido.
"O PT diz que seus governos são melhores que os anteriores. É verdade", afirma. "Mas não contribuem para a transformação social." Para Cid, durante os governos petistas "a política se avacalhou mais". "Mesmo o pessoal que vota na Dilma tem uma percepção pior da política, de malandragem, de sacanagem... O ciclo do PT pode ter se esgotado", analisa o agora militante do PSOL.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

"Webjornalismo: política e jornalismo em tempo real", Juliano Borges


É um pouco antigo pro tema (de 2009) mas vale a pena conferir. Leitura simples, boas informações, embora datadas. Mas como estou lendo ou relendo vários livros sobre o assunto, recomendo. Para saber mais, clique AQUI.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

sábado, 18 de maio de 2013

Hemingway em português nos e-books gera polêmica entre editoras

Deu hoje no caderno "Ilustrada" da Folha de S. Paulo.



Editora de Hemingway nos EUA vende e-books no Brasil, sob protestos de grupo nacional

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CASSIANO ELEK MACHADO
DE SÃO PAULO


Se Ernest Hemingway se notabilizou por frequentar os territórios mais inóspitos do mundo, sua obra agora enfrenta, com percalços, um terreno igualmente duro: a internet brasileira.
A edição de livros digitais do escritor norte-americano (1899-1961) em português está colocando em conflito um dos maiores grupos editoriais do país, a Record, e uma gigante dos Estados Unidos, a editora Simon & Schuster.
Os campos de batalha são variados: entre eles, as lojas brasileiras da Amazon e da Apple e o site da Livraria Cultura. Até o fechamento desta edição, as três vendiam para o território nacional mais de uma versão digital em português de obras de Hemingway, as da editora Bertrand Brasil e as da americana Scribner.

"Dentro do território brasileiro, a Bertrand Brasil tem a exclusividade de publicar a obra. Eles não poderiam fazer isso", diz Sérgio França, responsável pela área digital do grupo Record (do qual faz parte a Bertrand).

Há duas semanas, a empresa notificou livrarias, como a Amazon brasileira, que chegou a suspender temporariamente a venda de e-books de clássicos como "O Velho e o Mar" com o selo da editora Scribner (parte do grupo Simon & Schuster).
Mas as vendas voltaram dias depois. O leitor nacional pode comprar atualmente, por exemplo, o romance "Por Quem os Sinos Dobram" na versão da Bertrand Brasil (tradução de Luiz Peazê) por R$ 41 e na do selo Scribner (com tradução de Monteiro Lobato) por R$ 20,39.

"Vamos voltar a notificar todos os que estão vendendo e tomar as devidas medidas", diz a diretora editorial da Bertrand Brasil, Rosemary Alves.
Procurado pela Folha sete vezes, desde o início de maio, por e-mail e por telefone, o diretor responsável pela área de direitos autorais da Scribner, Paul O'Halloran, não respondeu a nenhuma pergunta. Em sua única mensagem, questionou: "Posso saber por que você pergunta?".

HEMINGWAY BÚLGARO
Com as 12 obras de Hemingway à venda em português, é a primeira vez que o selo Scribner, fundado em 1846 e editora original de autores como Scott Fitzgerald, lança livros neste idioma.
Hemingway foi, nos Estados Unidos, o primeiro dos grandes escritores a ter livros digitais à venda, em 2002, pela mesma editora.
Além de vender as obras do autor em português, a mesma Scribner está comercializando pela internet os livros dele em búlgaro.


"Este episódio mostra que, com o digital, editoras de um país podem vender diretamente traduções de seus livros em outros países", diz Carlo Carrenho, consultor e diretor do site PublishNews.
"O maior problema para uma editora vender seus livros impressos em outro país sempre foi a distribuição física. No digital, isso cai e o grande custo é o da tradução", acrescenta ele.
No caso da Scribner, porém, ela vende traduções já existentes, como as feitas por Lobato e pelo também escritor Jorge de Sena, já publicadas em Portugal pela editora Livros do Brasil, que confirmou à Folha ter feito acordo com a editora americana.
Mas a venda da edição portuguesa, em versões impressas e digitais, seria ilegal, porque, segundo a Record, o contrato deles prevê exclusividade territorial.
"Não é comum que se convencione a possibilidade de venda do mesmo livro por mais de uma editora em um só território", diz o advogado especializado em direitos autorais Luiz Henrique Souza. "Pode estar ocorrendo edição fraudulenta."
"Esse é um tema fascinante, e que em direito é chamado de importação paralela", diz Ronaldo Lemos, fundador do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas, no Rio, e colunista da Folha. Para ele, "se a empresa brasileira decidir resolver a questão legalmente, terá de acionar a Justiça americana".
França, da editora Record, diz que não acredita que o episódio vá tomar este caminho. "Em geral, estes casos acabam sendo resolvidos de maneira cavalheiresca", diz ele, cujo departamento tem lançado 30 e-books por mês.
*
TIRE SUAS DÚVIDAS SOBRE EDIÇÃO DIGITAL
1. Uma obra literária pode ter simultaneamente mais de uma edição num país?
Pode, mas só se as obras do autor estiverem no chamado "domínio público" ou se os contratos não estabelecerem limites territoriais ou exclusividade - o que é muito raro no mercado editorial.
2. Que obras são consideradas de "domínio público"?
Para o direito brasileiro, podem ser publicadas por qualquer editora, em versão impressa ou digital, obras de autores mortos há mais de 70 anos. Hemingway, morto há 51 anos, não se enquadra na regra.
3. Existe alguma lei que impeça editoras estrangeiras de venderem e-books no Brasil em português?
Não existe nenhuma legislação específica que impeça que uma empresa estrangeira distribua e-books com alcance para o mercado brasileiro. Mas as editoras podem e costumam estabelecer limites territoriais quando compram os direitos da obra para um país.
4. A legislação é diferente para e-book ou impresso?
Não. A Lei 9610/98, que regulamenta os direitos autorais, aplica-se ao ambiente digital.
5. O que uma editora prejudicada pode fazer?
Pode procurar a editora original e pedir indenização ou procurar a distribuidora que invadiu o território da outra e solicitar a retirada da obra de circulação.
Fontes: advogados Liana Machado, Luiz Henrique Souza e Ronaldo Lemos


quarta-feira, 15 de maio de 2013

Livros sobre novas tecnologias em Jornalismo: "Webjornalismo", Magaly Prado


Já há algum tempo que estava para ler esse livro. Embora seja de 2011 ainda é atual e vale a pena ser lido especialmente por estudantes de Jornalismo, professores e jornalistas.

Para saber mais, clique aqui.

domingo, 12 de maio de 2013

"Folha explica Folha", Ana Estela de Souza Pinto


Gosto dessa coleção da Folha. Já li alguns. E recomendo esse sobre a própria Folha. Boa aula de Jornalismo. Não morro de amores pela empresa Folha e alguns de seus deslumbrados empregados, mas admiro algumas coisas que eles fazem. E essa Ana Estela de Souza Pinto, de quem já li outros dois interessantes livros (um deles muito bom para estudantes de Jornalismo) escreve muito bem.

No livro a autora comenta as acusações de que a Folha emprestou veículo durante a Ditadura aos órgão de repressão. Um trecho acima.

É livro pequeno e tem bom preço: em torno de R$ 15,90 no site da Publifolha.

Para saber mais, clique aqui.



Sete motivos para viver entre livros

Pesquei na Rede.

7 motivos para viver entre livros
Por: Danilo Venticinque*

Poucas compulsões de consumo são tão bem vistas socialmente quanto o desejo de acumular livros. Ao contrário dos admiradores de sapatos, perucas, miniaturas ou outros bens de consumo supostamente fúteis, que são forçados a dedicar-se a suas paixões de forma quase clandestina para escapar do julgamento alheio, fãs de livros podem disfarçar seu descontrole consumista como uma implacável sede de conhecimento. O advento dos livros digitais tornou a vida do aspirante a bibliófilo ainda mais fácil. Se antes era necessário enfrentar as barreiras do espaço, hoje uma biblioteca de dezenas de milhares de exemplares cabe no bolso de qualquer paletó, ou mesmo num celular. Um cartão de memória do tamanho da unha de um dedão pode armazenar mais de trinta mil livros – um acervo equivalente feito de papel exigiria um apartamento inteiro para abrigá-lo. O custo também deixou de ser um empecilho. É possível encontrar uma infinidade de obras disponíveis gratuitamente na internet, em domínio público, e o preço dos exemplares novos, sobretudo os importados, é um convite à compra por impulso.

A escolha entre os livros físicos e os digitais é uma questão de gosto, e um detalhe irrelevante diante da meta de formar a biblioteca ideal. Na busca por esse objetivo, tanto os fanáticos por tecnologia quanto os fetichistas do papel têm de se render aos ensinamentos dos grandes colecionadores do passado. O tradutor e editor francês Jacques Bonnet, dono de um acervo de mais de quarenta mil volumes, é uma das maiores autoridades no assunto. Sua coletânea de ensaios Fantasmas na biblioteca, recém-lançada no Brasil, reúne nove textos sobre seu amor pelos livros. Qualquer comprador compulsivo de literatura deveria fazer o enorme sacrifício de acrescentá-la a sua coleção. Com base nos ensaios de Bonnet, elaborei uma lista com suas sete principais razões para viver entre livros. Elas valem tanto para quem já se dedica à formação da biblioteca perfeita quanto para quem apenas gosta de livros, e estava à procura de uma desculpa para transformar seu apreço em loucura.

1) O prazer da posse
Aprendemos a ler na infância e, se conseguirmos escapar das inúmeras outras tentações que roubam a atenção das crianças, é possível desenvolver desde cedo uma paixão pela literatura. A compulsão por livros, porém, só chega mais tarde. Nossa velocidade de leitura se mantém constante, o tempo dedicado a ela se torna escasso e passamos a comprar mais livros do que somos capazes de ler. É uma decisão questionável, ao menos do ponto de vista econômico. “Livros são caros na compra; não valem nada na revenda; são caríssimos quando queremos encontrá-los e estão esgotados, escreve Bonnet. O custo é compensado pelo prazer da sensação de posse. Mesmo o exemplar não lido, é, de certa forma, conquistado por seu dono. Ou, como diria Bonnet, “também foram ‘lidos’ de um certo modo, estão classificados em algum lugar do meu espírito como na minha biblioteca.” Apesar de prazeroso, o acúmulo de livros não lidos é uma atividade que requer cuidado. Fantasmas na biblioteca reproduz o aviso de Sêneca: “Que me importam esses inumeráveis livros e essas bibliotecas, cujos proprietários, durante toda a vida, mal leram as etiquetas?” Por mais que a compra compulsiva de livros seja bem-vista, a meta final deve ser sempre a leitura, ainda que num futuro distante.

2) O flerte e a culpa
A falta de espaço ou de dinheiro podem frear a expansão de uma biblioteca pessoal, mas o maior inimigo do acúmulo de livros é a culpa. Quando a pilha de exemplares comprados e não lidos cresce, até o bibliômano mais perdulário começa a se sentir culpado por seus flertes. Felizmente, os ímpetos de racionalidade não costumam resistir a uma visita à livraria, ou mesmo a alguns minutos diante do computador. Faço uma confissão, certo de que meu caso não é o único. Num dia 31 de dezembro, ao perceber que a quantidade de livros não lidos em meu leitor digital e em minha estante seria suficiente para algumas décadas de leitura, prometi não comprar livros durante o ano seguinte. A promessa foi quebrada antes do fim de janeiro, quando o site de uma livraria anunciou uma promoção imperdível – a primeira de muitas naquele ano. Descobri que a resistência a comprar novos livros só aumenta o prazer de ceder à tentação. Os motivos que fazem um leitor se deixar vencer pelo flerte são os mais variados. Bonnet revela que, em sua juventude, comprou um exemplar de Lolita, de Nabokov, só porque gostou da capa, e se rendeu a O lobo da estepe, de Herman Hesse, por causa do título misterioso, mesmo sem conhecer o autor. Embora alguns livros sejam comprados depois de longos namoros, a maioria chega às estantes graças a essas paixões à primeira vista que, após a compra, se transformam em relacionamentos duradouros.

3) O apego inexplicável
Se compramos livros seguindo critérios quase irracionais, cedo ou tarde nos tornamos vítimas de nossos instintos e maculamos nossas coleções, grandes ou pequenas, com obras de baixa qualidade. Isso nos força a escolher entre o prazer de possuir um livro, mesmo ruim, e a vontade racional de passá-lo adiante e abrir espaço para outro volume, mais adequado às nossas expectativas. Nessas batalhas contra a razão, o desejo de preservação do acervo raramente é derrotado. “A escolha do que se deve guardar ou rejeitar requer uma energia que eu sempre economizei”, diz Bonnet. “Quem sabe se, no futuro, não terei necessidade de uma obra que, na hora, achei medíocre?”

4) O bibliotecário em cada um de nós
Os entusiastas do livro digital têm, aqui, um trabalho (e um passatempo) a menos do que os admiradores dos livros de papel. Em leitores digitais como o Kindle ou o Kobo, bastam alguns cliques para organizar toda sua coleção por título, data de leitura ou nome do autor. Os átomos são muito mais indóceis que os bits. Domar uma estante de pequeno ou médio porte exige no mínimo uma tarde de trabalho. Organizar uma coleção de milhares de volumes é uma tarefa para a vida inteira. Além do esforço braçal necessário para remover os livros das prateleiras e reorganizá-los, há o esforço intelectual de escolher entre vários critérios de organização. Ao contrário dos arquivos digitais, os livros de papel aceitam uma infinidade de classificações. Bonnet reproduz uma lista elaborada pelo romancista francês Georges Perec. Segundo ele, é possível organizar os livros por ordem alfabética (de título ou nome do autor), por continentes ou países, por cores, por data de aquisição, por data de publicação, por formatos, por gêneros, por grandes períodos literários, por línguas, por prioridades de leitura, por encadernações e por séries. Em seguida, Bonnet expõe as falhas de cada um desses critérios e volta a citar Perec: “Nenhuma dessas classificações é satisfatória em si mesma. Toda biblioteca se ordena a partir de uma combinação dessas classificações.”

5) A força dos hábitos
Os acumuladores de livros podem ser divididos em dois grupos. Alguns tratam seus exemplares com reverência. Outros encaram os livros como meros objetos de estudo e trabalho. Os membros do primeiro grupo tentam manter ao máximo o estado de conservação das obras. Ao abrir um volume da coleção de um deles (com a devida autorização do dono, acompanhada de instruções de manuseio), é difícil notar traços de contato com mãos humanas. Os elementos do segundo grupo são facilmente reconhecidos por suas estantes cheias de exemplares castigados pelo uso e repletos de anotações. Bonnet se enquadra no segundo grupo. “Escrevo em meus livros, a lápis, com caneta hidrográfica ou esferográfica. Aliás, não consigo ler sem alguma coisa à mão.” Os conservacionistas podem se gabar do fato de que suas coleções sobreviverão por mais tempo. Os anotadores compulsivos têm o privilégio de reler suas anotações anos depois de feitas, como recados ao leitor futuro numa máquina do tempo.

6) Memórias e fantasias
Embora a presença opressora dos livros comprados e não lidos iniba esse comportamento, é inevitável reler alguns exemplares que insistem em sair da estante para a cabeceira. Ao abrir um livro já lido, revisitamos não apenas as palavras do autor, mas também nosso próprio passado. O estado de espírito que tínhamos na primeira leitura ressurge na leitura seguinte, mesmo depois de muitos anos. Reler é discutir consigo mesmo, e muitas vezes discordar de julgamentos do passado. Bonnet cita o exemplo do escritor modernista Paul Morand, cujo estilo o encantara aos 20 anos, mas tornou-se insuportável numa releitura depois dos 60. Quem acumula enormes pilhas de livros não lidos depara com outro prazer da memória, mais melancólico: o de se emocionar pela primeira vez com um exemplar comprado há muitos anos e imaginar o que teria sido diferente em sua vida se o tivesse lido na primeira oportunidade. Quanto maior a lista de obras a ler, mais numerosas são as vidas paralelas. Se suas leituras não têm qualquer influência sobre suas decisões e seu modo de viver, você está lendo os livros errados.

7) O dom de esquecer
Por maiores que sejam as estantes, ou o espaço nos discos rígidos, a tarefa de processar o conteúdo (ou ao menos as capas e títulos) de uma coleção de livros cabe, em última instância, à mente do leitor – um instrumento fascinante, mas pouquíssimo confiável. Com o passar dos anos e o acúmulo dos livros nas prateleiras e na memória, obras que lemos com atenção podem ser quase totalmente esquecidas. Bonnet cita Pierre Bayard, autor de Como falar dos livros que não lemos, para explicar essa fraqueza. “É, antes de tudo, difícil saber com precisão se lemos ou não um livro, pois a leitura é o lugar do evanescente”, diz Bayard. Ao conversar com outro leitor sobre um livro que já lemos, não é raro perceber que deixamos de notar aspectos cruciais da obra, ou que apagamos trechos inteiros da memória. Se escolhermos o texto certo e esperarmos tempo o bastante para que a memória comece a nos trair, cada releitura da mesma obra pode ser uma experiência totalmente nova. Mesmo quem vive entre quarenta mil livros é capaz de perder-se num só.

* Danilo Venticinque é editor de livros de ÉPOCA. Conta com a revolução dos e-books para economizar espaço na estante e colocar as leituras em dia. Escreve às terças-feiras sobre os poucos lançamentos que consegue ler, entre os muitos que compra por impulso.

*Esse texto foi tirado do blog do JJ (http://www.blogdojj.com.br/), autor do livro Publicitar: Uma Nova Visão da Publicidade, lançado pela Qualitymark Editora.

sábado, 11 de maio de 2013

Resenhas em blogs atraem leitores e editoras

Deu hoje na Folha de S. Paulo. Especial para blogueiros de bom nível e ligados em livros.



A abertura da matéria.


Resenhas literárias de amadores na internet atraem leitores e abrem filão para editoras

FERNANDA EZABELLA
DE LOS ANGELES
RAQUEL COZER
COLUNISTA DA FOLHA

Todo mês, 75 mil pessoas acessam os vídeos em que o paulista Danilo Leonardi, 26, comenta livros. A carioca Ana Grilo, 37, diz ler até 150 títulos por ano para seu blog de resenhas, escrito em inglês. O americano Donald Mitchell, 66, já publicou 4.475 resenhas na Amazon -por parte delas, levantou R$ 70 mil, doados para uma ONG beneficente.

Os três são personagens de um movimento que, nos últimos anos, chamou a atenção de editoras e virou negócio: o de críticas de livros feitas na internet por amadores, que, com linguagem mais simples, atraem milhares de leitores.

Com o aumento na venda de e-books, a expansão da autopublicação e a concorrência ferrenha entre editoras, textos escritos por hobby ou por até R$ 1.000 tornaram-se uma alternativa de divulgação capaz de atingir nichos e multiplicar vendas de livros.

Nos EUA, páginas como o Hollywood Book Reviews e o Pacific Book Review cobram de autores e editoras de R$ 250 a R$ 800 por textos a serem publicados em até 26 sites, incluindo seções de comentários de lojas virtuais.

Editoras estrangeiras passaram, em meados da década passada, a enviar livros para blogueiros resenharem, tal como já faziam com a imprensa. Em 2009, casas como Record e Planeta importaram a ideia, que logo ganhou jeitinho brasileiro: concursos tão disputados quanto vestibulares.

Nesse formato, as editoras criam formulários de inscrições e selecionam blogs após criteriosa avaliação da audiência e da qualidade dos texto. O "pagamento", ressaltam editoras e blogueiros, são apenas os livros a serem avaliados, nunca dinheiro.

No fim do ano passado, 1.007 blogueiros concorreram a cem vagas de parceiros da LeYa. Na Companhia das Letras, foram 779 candidatos para 50 vagas no semestre.

Aqui e no exterior, editoras e autores investem em anúncios ou posts patrocinados em blogs, que com isso chegam a faturar R$ 2.000 por mês.

Mas, no geral, cobrar por resenhas pega mal, e a autorregulamentação dos blogueiros é implacável. O blog americano ChickLitGirls cobrava R$ 200 por uma "boa avaliação" até ser denunciado por uma escritora. O bate-boca subsequente levou à extinção da página, em 2012.

Para se manter com cobranças, só mesmo sendo rigoroso, como a Kirkus, tradicional publicação de resenhas que, em 2004, passou a oferecer serviço de marketing para autores autopublicados.

As críticas no site podem custar mais de R$ 1.000 a autores e editoras interessados, e nem sempre são positivas. Quem contratou o serviço pode ler antes e abortar a missão caso a avaliação seja ruim. O dinheiro não é devolvido.

Abaixo a reprodução do impresso dos boxes.


Para ler é só passar a mãozinha.



Por que os títulos de livros atualmente são tão longos?, pergunta Ruy Castro


Mais uma sacada genial de mestre Ruy Castro. Deu hoje na Folha.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

"Como lidar com crises, jornalistas e outros predadores", Ricardo Feltrin


Vi na Folha de S. Paulo. Parece interessante. Vou encomendar. Em breve comento aqui no blog. Leiam a sinopse publicada no site da Folha:

"Se a sociedade é uma selva, o jornalista está no topo da cadeia alimentar. Predador seletivo, ele costuma escolher suas vítimas em um seleto grupo de pessoas para, em vez de devorá-las, expô-las à apreciação pública. É com essa visão bem-humorada que o jornalista Ricardo Feltrin analisa os problemas que empresas, empresários e celebridades possam enfrentar com a mídia no livro "Como Lidar com Crises, Jornalistas e outros Predadores".
A obra disseca as delicadas relações desse público com os jornalistas e aponta, com base em situações reais, vários erros cometidos pelas "vítimas" do noticiário. Também indica soluções e ensina como uma vítima "inocente" pode se defender de erros jornalísticos ou de notícias adversas.
Com 25 anos de experiência, Feltrin oferece um bê-á-bá de como lidar com situações de crise, mas não se furta a comentar os pecados dos próprios jornalistas. O livro examina casos reais de empresas que cometeram erros de comunicação ou deixaram que problemas ficassem ainda maiores ao repercutirem nas redes sociais, e mostra que jornalistas também erram - e muito -, como na atabalhoada cobertura do Caso Escola Base. Por fim, o autor ainda oferece um guia de como assessores de imprensa podem se relacionar com as redações sem serem devorados."

Para saber mais, clique aqui.

A biblioteca de Paulo Francis

Deu domingo no caderno "Ilustríssima" da Folha.


JORNALISMO
Na cova da fera
A biblioteca de Francis repousa intacta em NY
LUCAS FERRAZ
RESUMO
A partir de seu escritório em Nova York, Paulo Francis agitava a cultura brasileira com opiniões controversas, novidades intelectuais e diatribes disparadas para todos os lados. Preservada por sua viúva, a biblioteca nova-iorquina do jornalista aguarda destino no Brasil e oferece uma visão de sua irrequieta cabeça.

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No 21º andar de um prédio na esquina da rua 47 com a segunda avenida, em Manhattan, há uma biblioteca formada sobretudo por títulos de política e história americanas que, há 16 anos, repousa à espera de um destino no Brasil. Desde a morte do jornalista e escritor Paulo Francis, em 4 de fevereiro de 1997, quase 5.000 livros seguem praticamente intocados em seu escritório. A viúva, a jornalista Sonia Nolasco ainda mora no apartamento, mas se limitou a guardar alguns de seus próprios livros nas estantes e retirou outros, que distribuiu entre amigos dele.
Após uma tentativa fracassada, Sonia agora quer selar o envio do material para o país. Seu desejo, disse à Folha, é que o destinatário seja o Instituto Moreira Salles (IMS), instituição privada que se especializou na compra e na conservação de acervos literários e é o destino dos sonhos de nove entre dez famílias de escritores brasileiros. Embora se fale em "doações", as negociações para cuidar de tais papeladas quase sempre envolvem somas consideráveis.
Francis viveu mais da metade de seus 66 anos em Nova York --sua segunda cidade, depois do Rio, onde nasceu em 1930. Na primeira vez, nos anos 1950, ainda era o adolescente Franz Paulo Trannin da Matta Heilborn, que acompanhava o pai, funcionário da Esso em Nova York. Na segunda, em 1971, já era Paulo Francis, o editor da "Senhor", do "Pasquim" e da área cultural do "Correio da Manhã", entre outros feitos. É a essa época que remonta a formação da biblioteca da rua 47.

DOAÇÃO
Houve uma tentativa de levar os livros para o Brasil logo após a sua morte, por infarto fulminante. O acervo seria doado ao empresário Ronald Levinsohn, amigo de Francis e então dono da UniverCidade (Centro Universitário da Cidade), no Rio. Sonia e o próprio Francis prometeram a Levinsohn a doação da biblioteca, sobretudo dos livros políticos.
Algo como uma antiga dívida de gratidão unia o jornalista ao empresário. Em 1983, Levinsohn esteve envolvido num escândalo financeiro conhecido como Delfin, no qual a então maior caderneta de poupança do país sofreu intervenção do Banco Central. À época, Francis o defendeu publicamente --somente 23 anos depois a Justiça inocentaria o empresário.
Com a morte de Francis, porém, a relação entre Sonia e Levinsohn desandou. A doação melou.
"Imagino que deve ter muita coisa legal na biblioteca", comentou o empresário, em dezembro passado. Ele estava em sua casa carioca, no Cosme Velho, recém-chegado de Nova York, onde tem um suntuoso apartamento em Park Avenue. "Nova York nunca mais foi a mesma sem o Francis", disse, ao ser informado pelo repórter sobre o teor da conversa. Levinsohn lamentou não ter conseguido levar a biblioteca para o Brasil. Diz, contudo, que "tem amigos que podem alocar os livros em algum lugar, talvez a PUC-Rio".
Por enquanto, a cidade de Francis só recebeu, na década de 1990, sua coleção de 379 laser discs, espécie de antecessor do DVD que não vingou. O acervo está disponível para consultas na sede carioca do IMS e inclui filmes, concertos, óperas, balés e musicais. Quanto à biblioteca, o instituto informou à Folha que a viúva do jornalista ainda não os procurou oficialmente. E que, antes de tomar qualquer decisão, será necessário avaliar o acervo.
A biblioteca de Francis revela a peculiar educação sentimental de um comentarista de TV que nasceu e se criou sob a lógica da Guerra Fria. Expõe também laços afetivos e certas engrenagens da mente de um dos mais polêmicos jornalistas brasileiros do século 20.
O escritório permanece tal e qual estava quando ele morreu: ainda estão lá os quadros e desenhos de amigos da turma do "Pasquim", como Millôr Fernandes. Ainda está lá, na parede em frente à escrivaninha, a foto de um ídolo de juventude, o revolucionário russo Leon Trotsky. Da janela à sua direita, Francis via a fileira de arranha-céus ao longo da segunda avenida, em direção ao sul.
As estantes são uma amostra da pauta de seu "Diário da Corte", a influente coluna que ele publicava na Folha entre 1975 e 1990: teatro e ópera, romances, poesia, policiais e, sobretudo, ensaios, jornalismo e livros de história e política do século 20. São inúmeras as obras de autores que transitavam entre o ensaísmo e a grande reportagem, e que praticavam uma crítica de cultura tão erudita quanto ferina. Sem Francis, provavelmente seriam menos conhecidos no Brasil nomes como Gore Vidal, Joseph Mitchell e Tom Wolfe. As estantes ainda abrigam os clássicos que ele adorava citar, como Bernard Shaw, Edmund Wilson, Thomas Mann, Aldous Huxley e James Joyce.
Vai se decepcionar quem esperar encontrar ali um manancial para pesquisar a cultura brasileira dos anos 1950 e 60, quando Francis fazia e acontecia no Rio. As poucas obras em português são de amigos (Millôr, sempre ele, Ivan Lessa, Roberto Campos), um ou outro clássico da literatura brasileira e alguma coisa sobre os tempos de militante político, perseguido pela ditadura militar (1964-85).
Nenhum volume ali vem de sua fase carioca. "Suspeito que ele deixou no Rio uma grande coleção de literatura e teatro, porque a mudança para Nova York foi muito repentina", especula Ruy Castro, amigo de Francis e pertencente à primeira nova geração de jornalistas formada sob influência direta de Francis. Sonia Nolasco, que foi casada com Francis por mais de duas décadas, diz que nunca teve notícias dos livros daquela época.
A grande quantidade de volumes denuncia o fraco que Francis tinha por obras sobre a Segunda Guerra Mundial (1939-45) e sobre todos os presidentes americanos entre os anos 30 e 90, em especial Roosevelt, Kennedy, Lyndon Johnson, Nixon, Carter e Reagan.
Em 1986, ele afirmou, em sua coluna na Folha, que lia no mínimo três livros por semana. "Leio muito rápido. Mas por prazer, serei franco, leio exclusivamente thrillers." O jornalista Lucas Mendes, seu amigo em Nova York e companheiro de bancada no "Manhattan Connection", hoje da GloboNews, lembra que Francis tinha cada vez menos interesse por autores novos. "Ele relia os favoritos e poucas publicações, a maioria inglesas e conservadoras", conta.
Em "O Afeto que se Encerra" (Civilização Brasileira, 1980), de memórias, um de seus livros mais bem-sucedidos, Francis conta: "Toda minha formação é europeia, de Dostoiévski a Stendhal, a Sartre (romancista). Ivan [Lessa] me levou aos americanos, me esculachando o conservadorismo, de Hemingway a Fitzgerald, a Norman Mailer, a Capote, a Faulkner etc.".
Além da infância, suas memórias narram sua carreira jornalística, sua tentativa de viver de literatura e a convivência com os amigos. Ivan Lessa é apresentado como "irmão mais novo", "como Jorge Zahar, Ênio Silveira, Millôr Fernandes e Cláudio Abramo são os mais velhos".
Assim como Ruy Castro, o jornalista e escritor carioca Sérgio Augusto conheceu Francis nos anos 1960: foi seu colega na redação do "Pasquim". Na biblioteca do amigo em Nova York, conta ele, "encontrei quase os mesmos autores que tinha e guardo na minha. Apesar da diferença de idade [12 anos], pertencíamos praticamente à mesma geração".
Em 1998, estimulado por Sonia Nolasco, Sérgio Augusto levou, como recorda, "uma meia dúzia de livros" da biblioteca da rua 47. "Descobri um bocado de ensaístas e historiadores por intermédio do Francis", completa. Entre eles estão Gabriel Kolko, Eric Bentley e Geoffrey Barraclough, este último, segundo Sérgio Augusto, publicado no Brasil por Jorge Zahar por indicação de Paulo Francis.
Francis não era um deles, mas sua biblioteca faria a festa de ratos de sebo com suas coleções de revistas dos anos 70, como os exemplares da "Partisan Review", mitológica publicação de esquerda sobre política e literatura que circulou entre 1934 e 2003.
"Ele não era um Mindlin", define Ruy Castro, citando o maior bibliófilo brasileiro, cuja biblioteca, doada à USP, acaba de ser aberta à pesquisa. "Francis não tinha um comportamento reverente ao livro. A relação dele com o livro era muito pragmática. Ele pegava, lia, marcava o que queria, podia pular páginas e capítulos. Ele deixava o livro para trás sem problema."
Ruy conta que, quando o visitava em Nova York, o programa de sempre era flanar pelas livrarias, principalmente a tradicional Brentano's, fundada em 1853 e que fechou as portas em 2011.

ROMANCE
Em "Radical Chique e o Novo Jornalismo", Tom Wolfe narra a obsessão de sua geração de jornalistas com "o Romance", que ele escreve assim, com ironia maiúscula: "O Romance parecia um dos últimos desses grandes golpes de sorte, como encontrar ouro ou achar petróleo, com que um americano podia, do dia para a noite, sum relance, transformar inteiramente seu destino."
"Não havia lugar para jornalistas", recorda Wolfe mais adiante, ao descrever um ponto de encontro de escritores em Nova York. "A menos que ali estivesse no papel de futuro romancista ou simples cortesão dos grandes".
De certa forma, à sua maneira, a geração de Francis também viveu essa fantasia com "o Romance". Tendo se notabilizado pela opinião desabrida e idiossincrática, ele morreu sem se consagrar na ficção, como almejava. Seus romances --a trilogia formada por "Cabeça de Papel" (1977), "Cabeça de Negro" (1979) e o póstumo "Carne Viva" (2008)-- nunca receberam a mesma atenção de sua produção jornalística.
Os dois primeiros têm como pano de fundo a ditadura brasileira, a revolução e a oligarquia carioca. Os dois protagonistas, que dialogam freneticamente sobre esses temas, são seus alter egos. Em "O Afeto que se Encerra", Francis diz que "Cabeça de Papel" foi a melhor coisa que já escreveu e relembra o conselho de amigos que leram o livro antes da publicação, como Ênio Silveira e Ivan Lessa, e previram o fracasso.
Ainda assim, ele se abalou com a má repercussão. Teve depressão e, como contou em suas memórias, chegou a pensar em suicídio. A frustração ainda reverbera em Sonia Nolasco, que rechaça a ideia de publicar mais inéditos: "Só tive aborrecimento com o que saiu depois que ele morreu. Gente dizendo que ele tinha virado de direita ou que ele não sabia escrever ficção. Porque não diziam isso na frente dele, quando estava vivo?"
O tempo, porém, tem mostrado que o juízo negativo não se deve a questões pessoais ou à costumeira ira de seus contemporâneos com suas controvertidas opiniões.
"Como jornalista ele é muito mais brilhante do que como romancista, e ele mesmo reconhecia isso", diz Cristiane Costa, que no livro "Pena de Aluguel" (Companhia das Letras) destrinchou a vida anfíbia de escritores-jornalistas no Brasil entre 1904 e 2004. Entre eles, é claro, está Paulo Francis.
"A literatura do Francis tinha problemas estruturais graves, qualquer leitor, mesmo os mais apaixonados, percebe", diz Cristiane. "As tramas são confusas, a arquitetura narrativa é desleixada. Talvez Francis não tivesse paciência para a carpintaria literária."
Ruy Castro conta que ele realmente ficava chateado quando alguém falava mal de sua obra ficcional. "Eu e ele, assim como o nosso mestre maior, Bernard Shaw, não somos para a ficção", diz Ruy, que já se aventurou em dois romances. "A literatura dele era de ideias, não de ação, o que é sempre mais difícil." Já Sérgio Augusto o compara a Gore Vidal e Susan Sontag, estrelas da crítica cultural americana: "Bem melhores no ensaio do que na ficção".
O acervo da rua 47 inclui, além da biblioteca, os manuscritos inéditos de dois projetos: um livro inacabado, "O Homem que Inventou o Brasil", ficção em inglês sobre Getúlio Vargas e o Brasil dos anos 1950, e uma peça de teatro, uma das paixões do jornalista que, jovem, chegou a atuar. Pelo desejo da viúva, o destino desse material também deverá ser o Rio de Janeiro: a Biblioteca Nacional.
A ideia do livro sobre Getúlio, que seria destinado ao mercado americano, lhe foi sugerida pelo amigo Paulo Bertazzi. Muitos amigos dele não conheciam o projeto. Na década de 1990, um esperançoso Francis enviou trechos a editores americanos. Não houve resposta. E o livro ficou sem ponto final.
Certa vez, numa coluna, ele comentou sua produção literária: "Dei meu recado. Talvez, com o tempo, receba a resposta. É a consolação do escritor que se sente rejeitado".