quarta-feira, 22 de agosto de 2012
"Marighella, o guerrilheiro que incendiou o mundo", Mário Magalhães
O Mário é meu camarada e recomendo sem ter lido ainda. Além disso, todos nós, especialmente meus alunos, precisam saber quem foi Marighella. Segundo a mensagem que me enviou, Mário Magalhães pesquisou por 9 anos a vida de Carlos Marighella, o guerrilheiro que se tornou um dos maiores inimigos da ditadura militar brasileira. A biografia chega nas livrarias em outubro.
Quer saber mais? Clique aqui, aqui ou aqui.
sábado, 4 de agosto de 2012
"Tempo de reportagem", Audálio Dantas
Tirei umas férias necessárias e merecidas, mas estou de volta aqui no nosso Blog. Para recomeçar uma dica que acabo de ler no site do Estadão. Audálio é um dos maiores jornalistas da história do Brasil. Vale a pena conferir.
Para saber mais, clique aqui.
Leiam abaixo a resenha de José Nêumane e a entrevista com Audálio que estão no site do Estadão.
'Tempo de Reportagem' reúne melhores textos do jornalista Audálio Dantas
Foram coletadas reportagens de Audálio publicadas pela revista 'O Cruzeiro' e 'Realidade'
José Nêumanne
Em 8 de julho, Audálio Dantas fez 80 anos. Em 27 de junho, Vladimir Herzog teria completado 75 se não tivesse sido torturado até a morte nos porões da repressão, em 25 de outubro de 1975. Do encontro da biografia dos dois – o primeiro nascido em Tanque d’Arca, no sertão alagoano, e o outro, em Osijek, na Croácia, parte do Reino da Iugoslávia quando Vlado (no Brasil, o nome foi adaptado para o português) nasceu – ocorreu no momento em que a ditadura militar desabou sobre os próprios pés de barro. Entre o croata e o sertanejo criou-se, então, um vínculo histórico que foi além do fato de ambos terem feito brilhante carreira jornalística. Herzog foi o mártir cujo sangue derramado batizou a volta da democracia. Audálio, o homem certo no lugar certo para indicar o caminho a ser seguido nesse rumo.
Veja também:
Audálio Dantas: 'Podemos escrever como ficcionistas, mas não fazer ficção'
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Parte da trajetória de Audálio, como se pode ler no texto acima, consta do livro Tempo de Reportagem, coletânea de seus melhores momentos de repórter. O maior destaque, claro, é a revelação em reportagem para a Folha de S.Paulo, em 1963, da catadora de papel Carolina de Jesus na Favela do Canindé, lançada para a glória literária com o sucesso de trechos de seu diário editados por ele no livro Quarto de Despejo. Foram coletadas reportagens de Audálio publicadas pela revista O Cruzeiro – caso da viagem, em 1963, a Canudos, na Bahia, cenário do clássico da literatura em português Os Sertões, de Euclides da Cunha. E registros selecionados do que ele escreveu, de 1970 a 1972, na revistaRealidade – da saga de catadores de caranguejo no mangue à rotina dos pescadores do Velho Chico.
Nada disso pode, contudo, ser comparado ao passo que deu após ser escolhido para encabeçar a chapa para substituir a diretoria do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, que, sob a presidência de Adriano Campanhole, se mostrava pouco disposta a enfrentar o regime militar no começo dos anos 1970. Sua vitória foi fundamental para que a entidade reagisse com firmeza e serenidade à violência cometida contra um colega que nada tinha que ver com a guerra suja.
Formado em Filosofia pela Universidade de São Paulo, Herzog foi teatrólogo, professor da Faculdade de Comunicação da própria USP e fez carreira de destaque como jornalista, tendo trabalhado em vários veículos, entre os quais este O Estado de S. Paulo e a BBCde Londres, até ser nomeado diretor de jornalismo da TV Cultura. Em 24 de outubro de 1975, foi convocado por agentes do Exército a dar esclarecimentos no DOI-Codi da Rua Tutoia. Apresentou-se no dia seguinte e de lá só saiu morto – sua foto, mostrando-o como que enforcado no próprio cinto, ganhou notoriedade.
Herzog se tornou assim a primeira vítima de morte dos órgãos encarregados do combate à guerrilha dos grupos armados de extrema esquerda sem ter nenhuma ligação com tais grupos. Até então, a tortura em alta escala praticada pelo regime atingia esses combatentes. Herzog foi acusado de pertencer ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), que era contra a luta armada.
Sua morte pode ter resultado da sanha anticomunista dos agentes do Estado que atuavam no DOI-Codi de São Paulo, mas é mais provável que tenha sido usada pela linha dura como argumento contra o movimento da ala branda que promovia a abertura ampla e gradual no governo Geisel. O então governador de São Paulo, Paulo Egydio Martins, era o alvo preferencial dos duros, que tentaram aproveitar-se do fato de ele ter nomeado o empresário e intelectual liberal José Mindlin secretário da Cultura e este, por sua vez, ter levado Herzog, e com ele um "ninho de comunistas", para uma emissora de televisão pública (para os militares, sinônimo de oficial).
A declaração explícita de guerra da linha dura ao núcleo brando do regime revoltou a consciência cívica nacional, que então ficou sabendo que a violência do Estado não prendia, torturava e matava apenas os revolucionários que queriam tomar o poder pelas armas para instalar uma ditadura de esquerda. Para que isso ocorresse foi fundamental a ação conjunta de três homens: o rabino Henri Sobel, que se recusou a sepultar Herzog entre suicidas no cemitério judeu; o arcebispo dom Paulo Evaristo, cardeal Arns, que desafiou o regime convocando uma celebração ecumênica que lotou a Sé; e Audálio Dantas. O presidente do Sindicato dos Jornalistas teve o tirocínio e a coragem de levar a opinião pública brasileira de forma firme, mas serena, à consciência de que a luta contra a ditadura era de todos e não tinha acabado com o triunfo do Estado contra a extrema esquerda dizimada. Foi o começo do fim do arbítrio dividido.
Em janeiro de 1976, o metalúrgico Manuel Fiel Filho, militante católico de esquerda, foi morto no mesmo DOI-Codi em que Herzog foi pendurado pelo cinto, o comandante do 2.º Exército foi exonerado com desonra e o colega de ofício da vítima Luiz Inácio Lula da Silva liderou greves no ABC. E o regime começou a ruir, sufocado pelo cinto de Herzog no pescoço, após ter feito a foice e o martelo sucumbirem a rajadas de metralhadora.
Audálio Dantas foi um dos artífices dessa derrocada.
Audálio Dantas: 'Podemos escrever como ficcionistas, mas não fazer ficção'
Livro reúne 13 trabalhos antológicos da longa carreira do jornalista
Luiz Zanin Oricchio - O Estado de S. Paulo
Aos 80 anos, que não aparenta de jeito nenhum, Audálio Dantas é um mestre. Um mestre do jornalismo, sereno, incisivo e sem sinal de vaidade. Quem o conhece sabe da trajetória de vida exemplar. Das grandes reportagens em jornais e revistas O Cruzeiro e Realidade. Da coragem na condução do Sindicato dos Jornalistas em sua hora mais dramática, a do assassinato do jornalista Vladimir Herzog nos porões do DOI-Codi, durante a ditadura militar.
José Patrício/AE
Reportagem sobre 'maratona do beijo' foi incluída na coletânea
Dessa faceta de jornalista exemplar, temos uma boa amostra em Tempo de Reportagem, que a editora Leya lança agora. São 13 relatos pinçados por Audálio de um longo trabalho na imprensa na condição de repórter, daquele tipo que, como se diz no jargão do ofício, não pode ter medo de gastar as solas dos sapatos, pois é nas ruas que estão as boas histórias e não no ar condicionado das redações.
Da atuação política ficaremos sabendo um pouco mais adiante, quando lançar A Segunda Guerra de Vlado Herzog, editado pela Civilização Brasileira e que chegará às livrarias em outubro. No livro, Audálio resgata a participação do Sindicato dos Jornalistas nesse episódio, marco trágico pelo assassinato de Vlado, mas também divisor de águas no enfrentamento da ditadura pela sociedade civil. Leia a seguir, a entrevista concedida por Audálio ao Sabático.
De todos os textos que você publicou em sua longa carreira, escolheu 13 para esta coletânea. Com que critério fez a seleção?Eu já havia publicado um livro, O Circo do Desespero, título de uma das reportagens, com dez textos. Agora reuni mais dois, um sobre Carolina Maria de Jesus e outro sobre uma maratona do beijo, prova bastante parecida com a da maratona da dança, e que escrevi para a Playboy em 1993. Tirei também uma matéria chamada Restos, sobre pessoas que vivem do lixo, que acho demagógica. Mas há outra novidade. Para este livro, escrevi uma espécie de making of de cada reportagem. Quer dizer, uma apresentação de cada uma delas, uma reavaliação desses textos, alguns já antigos, pelo meu olhar contemporâneo. O interessante é que às vezes o making of é tão ou mais extenso que a reportagem em si.
Desses, qual considera o mais importante?Sem dúvida, a reportagem sobre a Carolina Maria de Jesus, que teve repercussão imensa, mudou a vida da personagem e também a minha. É um texto do qual não gosto muito, mas ele tem essa importância. E é exemplo de como um repórter sai da redação atrás de uma coisa e pode encontrar outra, se estiver de olhos abertos. Eu saí para fazer reportagem sobre uma favela que estava se formando, no Canindé, na beira do Tietê, e descobri essa mulher que escrevia, mantinha um diário, tinha poemas e tudo o mais, e já andara por algumas redações de jornais tentando em vão chamar a atenção para o seu caso. Não gosto do meu texto, tem muito adjetivo, é até piegas. Serviu para revelar o caso e possibilitou a publicação do livro da Carolina. Tirou 100 mil exemplares, isso nos anos 50, e foi traduzido em vários países. O prefácio da edição em italiano é do Alberto Moravia.
Há essa constante na maior parte das suas reportagens, a presença do povo como personagem, não é? Bem distante do jornalismo de celebridades atual. Você não tinha dificuldade em vender algumas dessas pautas?Sempre tive essa busca por assuntos de fundo social. O tempo era outro, ainda assim um editor me censurou por colocar negros e pobres como personagens. Por exemplo, no caso de O Circo do Desespero, era uma abordagem diferente na cobertura habitual do carnaval, os desfiles, as mulheres gostosas, os bailes. Aqui, o caso era outro. Eram miseráveis atrás do prêmio, que se matavam numa maratona de dança interminável. Por sorte, o editor de O Cruzeiro era um intelectual, um homem sensível, Odylo Costa, filho. Entreguei o texto e ele, do Rio, mandou um telegrama dizendo que havia chorado ao lê-lo. Como digo no livro, acho que foi o maior elogio que recebi em minha carreira de repórter.
No entanto, o texto não é piegas...Sempre pretendo contar a história da melhor maneira, sem chantagear ninguém ou procurar comover.
Mas os textos são impactantes, emocionam, fazem pensar. Buscam assuntos fortes.Há uma proximidade temática entre essa reportagem sobre a dança e a outra sobre a maratona do beijo, que fecha o livro. São parecidas por esse aspecto, o mundo cão, armado para explorar desesperados que tentam ganhar algo. Mas se reparar, no primeiro caso são miseráveis atrás de uma recompensa para garantir necessidades básicas, como alimento. No outro, já se disputava um automóvel, símbolo de status. No fundo, a mesma coisa, a exploração das pessoas, transformadas em espetáculo na sua agonia.
A mais dura, me parece, é Juqueri - Nossos Desamados Irmãos Loucos. Que também traz uma inovação formal da técnica jornalística, um texto no qual se vê a compaixão pelo outro. Sim, para fazer uma reportagem desse tipo você tem de ser um observador. Mas precisa se identificar com o outro, com a dor do outro. Não existe neutralidade; tem o seu ponto de vista ali. E, quanto à forma, como aquele era um universo fragmentado, eu também escrevi em fragmentos, em flashes isolados, que faziam sentido no conjunto. Faço um tipo de jornalismo que não se enquadra naquele esquema do lead, das informações básicas, etc. Acho que se pode usar técnicas da literatura, como supor um determinado pensamento na cabeça de um personagem. Mas tenho receio de que a expressão "jornalismo literário" leve a pensar que estamos inventando algo, que estejamos fazendo ficção. O jornalista deve observar os fatos, ater-se às informações. Pode escrever como ficcionista, mas não fazer ficção. Deve também ouvir o máximo possível de pessoas, como fiz em Chile 70, logo após da eleição de Salvador Allende. Conversando com as pessoas de diferentes pontos de vista, percebia-se logo onde aquilo poderia dar. Não é algo que se faça num dia ou dois. Percorri o país de norte a sul, por mais de 3500 quilômetros e ouvi dezenas de pessoas antes de escrever.
E quanto ao livro sobre o caso Herzog?A Segunda Guerra de Vlado Herzog eu estava devendo havia 37 anos. O caso já foi esmiuçado de vários ângulos, houve até filme, mas faltava destacar a atuação do Sindicato dos Jornalistas na ocasião. A resistência, o culto ecumênico na Catedral da Sé, toda a reação à morte do Herzog foi um desafio à ditadura, um divisor de águas no processo de liquidação do autoritarismo, e o nosso sindicato teve participação importante em tudo isso.
Como você o escreveu?É uma história do Vlado, em sua parte biográfica. E a história daquele período e das circunstâncias que o levaram à morte. Eu não havia anotado nada. Levei ano e meio lembrando e escrevendo. Nas horas vagas, que se diga, pois não interrompi outras atividades profissionais para fazer esse livro. Fui lembrando. Parte dele é um diário em primeira pessoa, o resto é em terceira pessoa. Há esse lado íntimo, pessoal. Mas também entrevistei muita gente. Ouvi mais de 50 participantes dos fatos, José Mindlin, dom Paulo Evaristo Arns, o rabino Henry Sobel, jornalistas que haviam sido presos antes do Vlado como Sergio Gomes da Silva, Paulo Markun, Duque Estrada, a Clarice Herzog. Enfim, é um livro que eu sentia que devia ser escrito.
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